Como a ciência transformou vidas em Serrinha dos Pintos

A história de Silvana Santos e o Síndrome Spoan em Serrinha dos Pintos é um exemplo marcante de como a pesquisa científica pode transformar vidas. Localizada no nordeste do Brasil, esta pequena comunidade enfrentou um mistério há mais de duas décadas: muitos de seus filhos perdiam a capacidade de andar, sem uma explicação clara para tal condição até a chegada de Santos.
Silvana Santos, bióloga e geneticista, descobriu e nomeou o Síndrome Spoan, uma rara doença genética que afeta o sistema nervoso, causando fraqueza muscular progressiva. O síndrome ocorre quando um gene alterado é herdado de ambos os pais, tornando-se evidente nas famílias da comunidade devido ao elevado índice de casamentos entre primos, uma prática comum na região devido ao isolamento geográfico. Com isso, Santos conduziu uma rica pesquisa que culminou na primeira descrição da doença no mundo, conferindo-lhe o reconhecimento como uma das 100 mulheres mais influentes da BBC em 2024.
Antes da pesquisa de Santos, as famílias de Serrinha viviam sem uma resposta sobre as condições que afetavam suas crianças. A presença de Santos na comunidade foi um divisor de águas, conferindo visibilidade e permitindo acesso a recursos como cadeiras de rodas e apoio psicológico. A história é exemplificada pelas palavras de Marquinhos, um dos pacientes, que destaca a importância do diagnóstico recebido por Santos, que trouxe esperança e ajuda.
Apenas os casamentos entre famílias relacionadas aumentam o risco de transmitir mutações genéticas prejudiciais. Estudos demonstram que, enquanto o risco de ter um filho com uma desordem genética rara é de 2-3% para casais não relacionados, esse risco sobe para 5-6% entre primos. Em suas pesquisas, Santos encontrou que mais de 30% dos casais em Serrinha eram relacionados, resultando em uma terceira parte com filhos que apresentavam deficiências.
A dedicação de Santos à causa não se limitou a diagnósticos. Ela começou a coletar amostras de DNA e realizar entrevista com as famílias locais para entender melhor a origem da mutação que causa o Síndrome Spoan, um trabalho que levou anos. Em 2005, seu estudo revelou a presença da doença na população, identificando a perda de um pequeno fragmento de um cromossomo como a causa do problema. As origens da mutação podem ser traçadas à presença de colonizadores europeus na região há mais de 500 anos.
Além do significativo impacto na saúde e no bem-estar da comunidade, a pesquisa de Santos contribuiu para mudar a percepção sobre as pessoas com o Síndrome Spoan, que antes eram estigmatizadas. A introdução de cadeiras de roda não só promoveu atendimento e inclusão social como também preveniu deformidades posteriores, proporcionando qualidade de vida aos pacientes.
Hoje, embora Santos tenha se mudado para São Paulo, seu trabalho em Serrinha continua. Com o apoio do Ministério da Saúde do Brasil, um novo projeto de pesquisa está sendo realizado para oferecer teste genético a 5.000 casais na região. O objetivo não é proibir casamentos consanguíneos, mas educar as pessoas sobre os riscos genéticos associados.
O caso de Silvana Santos e o Síndrome Spoan em Serrinha dos Pintos ilustra a importância da pesquisa científica na saúde pública e nos laços familiares. A luta contínua para compreender e mitigar os efeitos dessa doença genética em uma comunidade isolada reflete não apenas um foco em tratamento, mas também um pedido de esperança para o futuro.